De 30 mil habilitados, 121 entraram com pedido de janeiro de 2023 a junho de 2024. Obrigações trabalhistas têm prioridade no plano de reestruturação
É grande a percepção de que o agronegócio brasileiro está em uma situação adversa. O aumento expressivo nos preços dos insumos, a queda no valor das commodities devido ao crescimento dos estoques mundiais e uma seca prolongada que atinge diversas regiões do Brasil, comprometem a produtividade e agravam a situação financeira dos produtores rurais. Com isso, há muitos casos de pedidos de recuperação judicial entre os produtores rurais.
No entanto, apesar do considerável aumento em porcentagem, em quantidade absoluta a situação se revela bem mais amena. “Precisamos colocar os números em perspectiva. Em um país com cerca de 3,5 milhões de produtores individuais, aproximadamente 30 mil podem utilizar a recuperação judicial. No entanto, 121 realizaram o pedido de janeiro de 2023 a junho de 2024, de acordo com dados da Serasa Experian”, explica Byanca Farias, advogada do Marcos Martins Advogados.
A recuperação judicial, regulamentada pela Lei n.º 11.101/05 é um recurso legal que permite ao produtor rural altamente endividado a chance de reestruturar suas dívidas, protegendo seu patrimônio e garantindo a continuidade das atividades, evitando assim a falência.
Entre as empresas do setor, chama atenção a situação da AgroGalaxy, com uma dívida significativa de R$ 4,6 bilhões com bancos, fornecedores e funcionários. “Na apresentação de um plano de reestruturação, que estabelece um cronograma de pagamentos que permita a continuidade das atividades, a prioridade é para a quitação de débitos trabalhistas”, lembra Byanca.
A remuneração mensal vencida nos três meses anteriores ao pedido de recuperação, no limite de até cinco salários-mínimos, deverá ser paga dentro de trinta dias. As ações trabalhistas em andamento prosseguem na Justiça do Trabalho até o reconhecimento do direito e a quantificação do valor devido, que é habilitado no juízo cível, respeitando o plano recuperacional. Há também o prazo de um ano para pagamento dos créditos trabalhistas e os decorrentes de acidentes de trabalho, vencidos até a data do pedido de recuperação judicial.
“Há diversos outros aspectos importantes em relação à recuperação judicial e às relações trabalhistas, por isso esse processo pode gerar incertezas para os empregadores e empregados. Os trabalhadores podem enfrentar a possibilidade de atrasos nos pagamentos, benefícios e rescisões. Isso ocorre porque as ações e execuções ficam suspensas por 180 dias, contados a partir do deferimento do processamento da recuperação judicial”, afirma Byanca.
Além dos riscos de inadimplência, a recuperação judicial impacta diretamente na manutenção dos postos de trabalho. Em muitos casos, os empregadores são obrigados a reduzir o quadro de empregados ou a renegociar condições laborais, o que pode ser complicado no agronegócio, que depende de mão de obra temporária e sazonal.
“Diante desse cenário, a implementação de estratégias preventivas é fundamental para que as empresas no agronegócio enfrentem períodos de crise de forma mais resiliente. Uma das principais ações necessárias é avaliar e reestruturar contratos de forma estratégica, de acordo com as especificidades da legislação trabalhista e empresarial aplicável ao setor, atuando na antecipação de riscos e contribuindo para uma gestão mais flexível e adequada aos desafios do agronegócio”, finaliza Byanca Faria